Mundo da poesia
Mundo da Poesia. As melhores poesias para você ler, relaxar e mergulhar em um universo leve, sem preocupações. Não deixe de ler os poemas incríveis que separamos pra você!
Via Láctea Olavo BilacOra (direis) ouvir estrelas! Certo
Perdeste o senso!” E eu vos direi, no entanto,
Que, para ouvi-las, muita vez desperto
E abro as janelas, pálido de espanto…
E conversamos toda a noite, enquanto
A Via Láctea, como um pálio aberto,
Cintila. E, ao vir do sol, saudoso e em pranto,
Inda as procuro pelo céu deserto.
Direis agora: “Tresloucado amigo!
Que conversas com elas? Que sentido
Tem o que dizem, quando estão contigo?”
E eu vos direi: “Amai para entendê-las!
Pois só quem ama pode ter ouvido
Capaz de ouvir e de entender estrelas.
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Um Dia Acordarás Mario QuintanaUm dia acordarás num quarto novo
sem saber como foste para lá
e as vestes que acharás ao pé do leito
de tão estranhas te farão pasmar.
A janela abrirás, devagarinho:
fará nevoeiro e tu nada verás…
Hás de tocar, a medo, a campainha
e, silenciosa, a porta se abrirá.
E um ser, que nunca viste, em um sorriso
triste, te abraçará com seu maior carinho
e há de dizer-te para o teu assombro:
-Não te assustes de mim, que sofro há tanto!
Quero chorar – apenas – no teu ombro
e devorar teus olhos, meu amor…
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Soneto da Separação Vinícius de MoraesDe repente do riso fez-se o pranto
Silencioso e branco como a bruma
E das bocas unidas fez-se a espuma
E das mãos espalmadas fez-se o espanto.
De repente da calma fez-se o vento
Que dos olhos desfez a última chama
E da paixão fez-se o pressentimento
E do momento imóvel fez-se o drama.
De repente, não mais que de repente
Fez-se de triste o que se fez amante
E de sozinho o que se fez contente.
Fez-se do amigo próximo o distante
Fez-se da vida uma aventura errante
De repente, não mais que de repente.
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Os Olhos da Morte Martins FontesA impressão já guardaste, de estranheza,
Já tiveste a memória da agonia,
Vendo uma luz qualquer, durante o dia,
Que, às vezes, fica, por descuido, acesa?
Causa-nos mal-estar, dando surpresa,
Uma alâmpada, a arder, serena e fria:
Enquanto o sol fortíssimo irradia,
Mete medo esse olhar, pela tristeza.
O ouro é fúnebre e fosco. Sem viveza,
A imóvel chama esbate-se, e, sombria,
Vela de crepe a imagem da beleza.
Fogo-fátuo que as campas alumia,
Essa impassível, gélida clareza,
Vem dos olhos da Morte: ela vigia.
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Pranto Seco Jorge de LimaO que há sob essa máscara é um pranto seco,
pranto final, sem lágrimas, calado.
A pele ressecou-se em fruto peco,
a fronte dolorida, o olhar parado.
Não há saída mais para esse beco.
Tudo perdido, tudo consumado.
O que há sob essa máscara é um pranto seco,
sem esponja de fel e último brado.
As formigas subiram pela fronte
e desceram ligeiras pelos cravos
das patas ressequidas, pelas unhas…
Cadáver seco em solitário monte,
sem complacências e sem desagravos,
sem madalenas e sem testemunhas.
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Mancha Manuel BandeiraPara reproduzir o donaire sem par
Desse alvo rosto e desse irônico sorriso
Que desconcerta e prende e atrai, fora preciso
A mestria de Helleu, de Boldini ou Besnard
Luz faiscante malícia ao fundo desse olhar,
E há mais do inferno ali do que do paraíso…
O amor é tão-somente um pretexto de riso
Para esse coração flutuante e singular.
Flor de perfume raro e de esquisito encanto,
Ela zomba dos que (pobres deles!) sem cor
Vão-lhe aos pés ajoelhar ingenuamente… Enquanto
Alguém não lhe magoar a boca de veludo…
E não a fizer ver, por si, que isso de amor
No fundo é amargo e triste e dói mais do que tudo.
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Canção de Outono Cecília MeirelesPerdoa-me, folha seca,
não posso cuidar de ti.
Vim para amar neste mundo,
e até do amor me perdi.
De que serviu tecer flores
pelas areias do chão,
se havia gente dormindo
sobre o própro coração?
E não pude levantá-la!
Choro pelo que não fiz.
E pela minha fraqueza
é que sou triste e infeliz.
Perdoa-me, folha seca!
Meus olhos sem força estão
velando e rogando áqueles
que não se levantarão...
Tu és a folha de outono
voante pelo jardim.
Deixo-te a minha saudade
- a melhor parte de mim.
Certa de que tudo é vão.
Que tudo é menos que o vento,
menos que as folhas do chão...
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E Agora José? Carlos Drummond de AndradeE agora, José?
A festa acabou,
a luz apagou
o povo sumiu,
a noite esfriou,
e agora, José?
e agora, você?
você que é sem nome,
que zomba dos outros,
você que faz versos,
que ama, protesta?
e agora, José?
Está sem mulher,
está sem discurso,
está sem carinho,
já não pode beber,
já não pode fumar,
cuspir já não pode,
a noite esfriou,
o dia não veio,
o bonde não veio,
o riso não veio,
não veio a utopia
e tudo acabou
e tudo fugiu
e tudo mofou,
e agora, José?
E agora, José?
Sua doce palavra,
seu instante de febre,
sua gula e jejum,
sua biblioteca,
sua lavra de ouro,
seu terno de vidro,
sua incoerência,
seu ódio – e agora?
Com a chave na mão
quer abrir a porta,
não existe porta,
quer morrer no mar,
mas o mar secou;
quer ir para Minas,
minas não há mais.
José, e agora?
Se você gritasse,
se você gemesse,
se você tocasse
a valsa vienense,
se você dormisse,
se você cansasse,
se você morresse...
Mas você não morre,
você é duro, José!
Sozinho no escuro
qual bicho-do-mato,
sem teologia,
sem parede nua
para se encostar,
sem cavalo preto
que fuja a galope,
você marcha, José!
José, para onde?
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Noite Cecília MeirelesÚmido gosto de terra,
Cheiro de pedra lavada
- Tempo inseguro do tempo! –
Sombra do flanco da serra,
Nua e fria, sem mais nada.
Brilho de areias pisadas,
Sabor de folhas mordidas,
- Lábio da voz sem ventura! –
Suspiro das madrugadas
Sem coisas acontecidas.
A noite abria a frescura
Dos campos todos molhados,
- Sozinha, com o seu perfume! –
Preparando a flor mais pura
Com ares de todos os lados.
Bem que a vida estava quieta.
Mas passava o pensamento…
- De onde vinha aquela música?
E era uma nuvem repleta,
Entre as estrelas e o vento.
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Eu Sou Aquele Mario QuintanaEu sou aquele que, estando sentado a uma janela,
a ouvir o Apóstolo das Gentes,
adormeci e caí do alto dela.
Nem sei mais se morri ou fui miraculado:
consultai os Textos, no lugar competente -
o que importa é que o Deus que eu tanto ansiava
como uma luz que se acendesse de repente,
era-me vestido com palavras e mais palavras
e cada palavra tinha o seu sentido…
Como as entenderia – eu tão pobre de espírito
como era simples de coração?
E pouco a pouco se fecharam os meus olhos…
e eu cada vez mais longe… no acalanto
de uma quase esquecida canção…
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